Aquecendo os motores para o Oscar 2020, que ocorre em 9 de fevereiro, o Mulher no Cinema vai publicar, diariamente, um breve perfil de todas as profissionais indicadas em cada uma das categorias.
Oscar 2020: Confira a lista completa com todas as mulheres indicadas
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Já falamos sobre as mulheres que concorrem a melhor filme, atriz, atriz coadjuvante, roteiro original, roteiro adaptado, animação e documentário. A categoria da vez é filme internacional (antes conhecida como filme estrangeiro), na qual só há um longa codirigido por mulher entre os cinco indicados: Honeyland, de Tamaka Kotevska e Ljubomir Stefanov, que representa a Macedônia do Norte e também está indicado a documentário.
O filme acompanha o cotidiano de Hatidze Muratova, uma apicultora que vive em um pequeno e remoto vilarejo macedônio. Ela cuida da mãe doente e também das abelhas, mas a chegada de uma família nômade ameaça o equilíbrio da natureza, a sustentabilidade do lugar e o trabalho de Hatidze.
Este é o primeiro longa da diretora Tamaka Kotevska, que nasceu em 1993 em Prilep, na Macedônia do Norte, e estudou na Faculdade de Artes Dramáticas da Universidade de Skopje. Ela focou sua formação no documentário, mas também dirigiu os curtas de ficção Games (2014) e Free Hugs (2015). Sua parceria com Ljubomir Stefanov começou com Lake of Apples (2017), curta documental sobre o lago Prespa, na Macedônia, que foi patrocinado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Honeyland começou como um projeto similar a Lake of Apples: a princípio, a dupla iria fazer um curta sobre biodiversidade e sustentabilidade para o Projeto de Conservação Natural da Macedônia. No entanto, quando conheceram Hatidze, perceberam que tinham um longa nas mãos. O carisma da apicultora e o fato de ela nunca usar todo o mel disponível chamou a atenção dos cineastas. A filosofia de Hatidze – “metade para as abelhas, metade para mim” – dialogava com os temas que eles queriam abordar.
As filmagens foram desafiadoras, principalmente pelo fato de o vilarejo ser muito remoto e não ter eletricidade. Sem podem carregar a bateria dos equipamentos, a equipe de seis pessoas (incluindo os diretores) tinha de ficar no máximo quatro dias de cada vez. No total, o processo levou três anos. A equipe dormia em barracas e redes e os diretores de fotografia Fejmi Daut e Samir Ljuma usaram apenas luz natural ou de velas.
Outro aspecto interessante é que, quando falava com a mãe e com a família vizinha, Hatidize usava um dialeto turco que ninguém da equipe do filme entendia. No entanto, Kotevska disse ao site IndieWire que a questão da língua acabou sendo uma vantagem. “Isso revelou para nós o nível mais básico de comunicação, que é o não verbal. Ficamos observando-os como diretores, sem entender o que diziam, e foi ótimo porque percebemos que as coisas funcionavam mesmo sem tradução”, contou.
Quando chegaram à edição, eles tinham 400 horas de filmagens – e o primeiro corte foi feito sem som. A equipe, aliás, chegou a considerar lançar o filme sem legendas, construindo toda a ação e a emoção pelas imagens, não pelo diálogo. Quando optaram por fazer a transcrição das falas, o corte mudou um pouco, mas eles se surpreenderam com o fato de que, com tradução ou não, o documentário continuava basicamente o mesmo. “A linguagem corporal é o aspecto crucial desse filme”, definiu Kotevska, em entrevista ao The Moveable Fest.
Honeyland chamou a atenção do público e da crítica na edição de 2019 do Festival de Sundance, quando ganhou três prêmios, incluindo o de melhor documentário internacional e o de melhor fotografia. De lá para cá, o longa colecionou troféus. Na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, por exemplo, foi reconhecido pelo júri como o melhor documentário, e pelos críticos como o melhor filme internacional. Tamara Kotevska e Ljubomir Stefanov também foram indicados ao prêmio do Sindicato dos Diretores.
Veja um vídeo da Cineuropa sobre Honeyland (com legendas em inglês):
Esta é a segunda vez na história que uma produção da Macedônia do Norte disputa o Oscar, depois de Antes da Chuva (1994), de Milcho Manchevski. Concorrer na categoria de filme internacional é um processo de três fases. Primeiro, cada país escolhe o seu candidato e o pré-indica à Academia. Depois, é divulgada a lista com dez semifinalistas, e por fim, os cinco indicados que de fato disputarão o prêmio.
Neste ano, mulheres dirigiram 28 dos 93 longas que tinham sido inscritos, ou cerca de 30,1%, o melhor índice desde que o Mulher no Cinema começou a fazer este levantamento, há quatro anos. Em 2018, a porcentagem ficou em 23%; em 2017, foi de 28%; e em 2016, apenas 18%.
Até hoje, só três filmes dirigidos por mulher venceram na categoria: A Excêntrica Família de Antônia (1995), da holandesa Marleen Gorris; Lugar Nenhum na África (2002), da alemã Caroline Link; e Em um Mundo Melhor (2001), da dinamarquesa Susanne Bier. Saiba mais sobre o Oscar de filme internacional
Luísa Pécora é jornalista e criadora do Mulher no Cinema
Foto do topo: Beeld Ilya S. Savenok/Getty Images
* O Mulher no Cinema publica perfis de todas as mulheres indicadas ao Oscar 2020 até 7/2. A cada dia é publicado um texto sobre uma categoria diferente. Acompanhe a série completa aqui.