“Eu Também Não Gozei”: Veja uma cena inédita do filme que estreia em Tiradentes

Uma mãe solo está no centro de Eu Também Não Gozei, documentário da diretora Ana Carolina Marinho que foi selecionado para a principal competição da 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes. A primeira exibição mundial do filme, marcada para 22 de janeiro, integra a programação da Mostra Aurora, dedicada a produções independentes de realizadores com até três longas-metragens.

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Eu Também Não Gozei conta a história de Letícia Bassit, uma mulher que, ao saber que está grávida, entra em contato com os quatro possíveis genitores. Sem apoio, ela segue em uma gestação solitária e, após o nascimento de seu filho, decide descobrir quem é o pai.

Veja uma cena inédita de Eu Também Não Gozei, divulgada com exclusividade pelo Mulher no Cinema:

Eu Também Não Gozei é um de apenas dois filmes dirigidos por mulheres entre os sete selecionados para a mostra Aurora deste ano (o outro é Eros, de Rachel Daisy Ellis). A sessão do dia 22 será às 20h, na Cine-Tenda da Mostra de Tiradentes, com entrada gratuita.

O Mulher no Cinema publica, também com exclusividade, uma carta escrita pela protagonista do documentário, Letícia Bassit, e dedicada às mães, especialmente às mães solo. Leia abaixo:

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Mães, 

É um prazer escrever essa carta para vocês. Não sei se vocês estão sabendo: um filme que conta a história de quando engravidei do meu primeiro filho vai estrear na Mostra de Cinema de Tiradentes. Foram seis anos de filmagem ao lado da diretora Ana Carolina Marinho, minha amiga, parceira da vida e da arte. É estranhamente fascinante olhar para a tela e ver a mim mesma em um tempo que já não é o tempo de agora mas, ainda assim, se faz presente em meu corpo. Hoje também em outros corpos. Eu-atriz, pesquisadora das artes da cena, das linguagens e do fazer artístico. Que loucura assinar o roteiro (ao lado de Anna Zêpa, Amanda Bortolo e Luz Barbara) de um documentário que narra minha própria história! É tomar distância da minha experiência e fazer com que meu corpo seja travessia, território de passagem, para revelar uma narrativa que não é só minha. 

É fazer do indizível, do impossível 

algo palpável. 

É dar forma ao vazio. 

É ter a oportunidade de organizar uma dor. 

Estética é política. 

Política é também fazer da dor individual luta social. 

Sou uma mulher branca, de classe média, moradora da cidade de São Paulo. Eu, espectadora de mim mesma, vivo/assisto minha experiência ambivalente, contraditória, vulnerável, esburacada, repleta de perguntas e ausente de respostas. Ofereço meu corpo para que, através dele, façamos perguntas urgentes: 

O que representa uma mulher engravidar sem saber quem é o pai do próprio filho? Que corpo é esse em nossa sociedade? Quantas mães se identificam com a minha história? Quantos pais existem por aí e não sabem que são pais? Quantas mães existem por aí e não sabem que são mães? O que é MÃE? O que é PAI?

Ao longo desses seis anos, pude estudar e pesquisar mais profundamente sobre questões relacionadas a gênero, diversidade sexual, performance, psicanálise e parentalidade. Foi, a partir de uma experiência pessoal, que percorri o caminho para fora de mim e me deparei com uma realidade social violenta. No Brasil, existem mais de 5,5 milhões de crianças sem o nome do pai no registro. 

Por quê? Como desnaturalizar o abandono paterno? Como tirar da mãe a total responsabilidade pelo trabalho de cuidado?

Levanto tantas e tantas perguntas enquanto marcho em direção ao horizonte. Sem romantismo. Não há tempo. Vocês querem vir comigo? 

Luto

com amor, 

revelando toda a injustiça que mulheres cis enfrentam desde sempre. Sustento meu lugar de fala enquanto sigo atenta e reflexiva à complexidade em torno das discussões de gênero, sexualidade, raça e classe: e se fosse com uma mulher pobre? E se fosse com uma mulher negra? E se fosse com uma mulher trans? Um homem trans? Quais seriam as subjetividades reveladas a partir da narrativa que se constrói no filme? Quais violências seriam explicitadas? 

Espero que o filme seja bem recebido por vocês, mas não só. Que pais ausentes e presentes, filhos, cuidadores, genitores e educadores também tenham acesso à essa história, espalhando reflexão e mudanças profundas. Acredito no poder estético-político do cinema! 

Amor e luta! Sigamos juntas.

Um beijo, 

Letícia Bassit 
18/01/2024

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