Mulheres vão bem na bilheteria, mas algo mudou em Hollywood?

A sensação é a de que nunca se falou tanto sobre a (falta de) representação feminina em Hollywood. Da desigualdade de salários comprovada pelo ataque de hackers contra a Sony à polêmica do salto alto no Festival de Cannes, passando pelo discurso de Patricia
Arquette no Oscar e a campanha por perguntas menos machistas no tapete vermelho, o tema tem rendido comentários constantes de atrizes, diretoras, produtoras e outras profissionais da indústria.

Ao mesmo tempo, filmes centrados em mulheres têm tido ótimo desempenho nas bilheterias. Só este ano, a lista de sucessos inclui “A Escolha Perfeita 2”, “A Espiã que Sabia de Menos”, “Divertida Mente” e até “Max Max: Estrada da Fúria”, no qual o protagonista é Tom Hardy, mas quem brilha é a Imperator Furiosa de Charlize Theron.

Charlize Theron em 'Mad Max - Estrada da Fúria
Charlize Theron em ‘Mad Max – Estrada da Fúria”

Será, então, que algo está mudando em Hollywood? Tanta discussão e tantos sucessos comerciais significam alguma coisa?

É este o tema de uma ótima discussão entre A.O. Scott e Manohla Dargis, os principais críticos do jornal “The New York Times”. Em
texto publicado na sexta-feira (3), Dargis afirma que estamos vendo “um ativismo crescente ou uma recém-encontrada coragem” de discutir o tema na indústria cinematográfica, o que ecoa o “ressurgimento do feminismo” nas universidades e na internet.

No entanto, ela lembra que todos os longas citados acima foram dirigidos por homens, com exceção de “A Escolha Perfeita 2”. Ou seja: mais filmes centrados em mulheres não necessariamente se traduzem em mais filmes feitos por mulheres. Scott concorda que o padrão de “discriminação e exclusão” segue inalterado:

“É bastante simples: os homens têm mais e melhores chances de fazer filmes. Um queridinho de Sundance tem mais possibilidades de ser contratado para um projeto de prestígio ou comercialmente significativo, e mais chances de tentar ter sucesso, caso seu esforço não dê resultado. Os caras poderosos de meia-idade, sejam diretores consagrados ou executivos dos estúdios, procuram por versões mais jovens de si mesmos para estimular, promover e confiar trabalhos lucrativos.”

Mas Scott também acredita que os bons resultados nas bilheterias podem ser um sinal de que Hollywood está voltando a ver as mulheres como parte fundamental da plateia, e não como nicho demográfico. E levanta um ponto interessante: qual o papel do público nesta discussão? O sucesso de filmes centrados em mulheres são a fonte da mudança ou um reflexo dela?

Dargis opina:

“Há alguns anos fui assistir a uma palestra do historiador e ativista de filmes gays Vito Russo, na qual ele desafiou a plateia a ‘votar’ por melhores representações dos homossexuais usando seu ingresso de cinema (…) Se você quer imagens melhores, argumentou, precisa apoiar os cineastas gays e lésbicas que trabalham fora do sistema. Os filmes independentes podem não ser tão ‘divertidos’ como os do mainstream, mas você estará apoiando a estética da liberação.

É mais complexo do que isso, e com certeza Russo sabia que era, assim como sabia que a luta por direitos humanos acontece em vários campos, inclusive no da representação (…) É claro que as mulheres não são uma minoria, e isso pode fazer nossa luta por igualdade muito diferente e difícil de entender. Ao mesmo tempo, talvez o sucesso de ‘A Escolha Perfeita 2’ e outros filmes estrelados por mulheres signifique que elas (finalmente!) se cansaram de ver atrizes relegadas a segundo plano enquanto um cara parte numa missão.”

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