A atriz, roteirista e diretora alemã Ina Weisse, 53 anos, cresceu cercada de referências e hábitos culturais. Filha de pai arquiteto e mãe professora de artes, ela se lembra da Bolex Super 8 que estava sempre por perto durante a juventude, e com a qual a família registrava as férias. “Cada um de nós atuava, dirigia ou segurava a câmera”, afirmou a diretora, em entrevista por e-mail ao Mulher no Cinema.
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O universo musical também é familiar à cineasta, e elemento central de seu segundo longa-metragem, A Professora de Violino, que estreia nesta quinta-feira (17) nos cinemas de Belém (PA), Porto Alegre (RS), São Paulo (SP) e Recife (PE). O filme marca a segunda parceria de Weisse com a roteirista e realizadora grega Daphne Charizani, com quem escreveu seu longa de estreia, O Arquiteto (2008).
Juntas elas chegaram à personagem Anna Bronsky, vivida por Nina Hoss, consagrada atriz alemã conhecida pelos filmes Barbara (2012) e Fênix (2014), de Christian Petzold, e premiada no Festival de San Sebastián pelo trabalho em A Professora de Violino. No filme, Anna está em crise não apenas com a carreira numa prestigiada academia de música de Berlim, mas também na vida íntima ao lado do marido e no que diz respeito à educação do filho pré-adolescente. À medida que a data da audição de seu novo aluno se aproxima, ela começa a pressioná-lo, criando um ambiente tóxico e violento para todos ao seu redor.
Weisse toca violino e usou sua experiência em orquestras para retratar o difícil processo de aprendizado que busca pela perfeição. Na entrevista a seguir, ela fala sobre o poder da música no cinema, a parceria com Daphne Charizani e o interesse por uma protagonista “dilacerada por contradições”.
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A Professora de Violino acompanha uma mulher e suas inseguranças, como se a vida dela fosse feita de pequenas audições pelas quais precisa passar – maternidade, carreira, ser amada como mulher e como filha. Como surgiu a ideia desse roteiro? Por que quis contar essa história?
Estávamos interessadas nessa mulher dilacerada por contradições. Desenvolvemos a história em torno dessa figura. Ela é vulnerável porque tem grandes expectativas em relação a si mesma e, ao mesmo tempo, tem medo do fracasso. Ela sabe que ninguém pode tirar sua insegurança. Sua convicção de que tudo tem de estar subordinado à música, de que é preciso lutar e sempre se erguer de novo, de que algo nunca está bom o suficiente e nunca termina – tudo isso a coloca sob grande pressão. Ela passa essa pressão para o filho e o aluno.
Como foi co-escrever um roteiro novamente com Daphne Charizani?
Escrever um roteiro é um processo muito íntimo. Você se abre e aprende muito com a outra pessoa. Nosso trabalho em conjunto nunca foi sobre vaidade ou sobre quem tem suas ideias aceitas. Sempre foi sobre o tema e sobre a melhor forma de chegar ao núcleo da personagem.
Por que pensou em Nina Hoss para o papel da protagonista?
Nina Hoss é uma ótima atriz. Ela é muito precisa na maneira como se prepara para um papel, ao mesmo tempo em que é imparcial e aberta quando o interpreta. Ela é muito corajosa. Trabalhar com ela é maravilhoso.
Você costumava tocar violino e tem formação musical. Além de a personagem ser professora de violino, qual a importância da música – ou a ausência dela – em seus filmes? Em quais detalhes você acaba prestando mais atenção?
Não foi fácil escolher as músicas certas que combinassem com a história, tanto em termos de conteúdo quanto de estética. A música tem grande poder e pode influenciar muito a percepção do espectador. A música é sedutora. A música seduz e pode manipular. Especialmente no momento em que a orquestra estudantil toca o Concerto para Violoncelo de Carl Philipp Emanuel Bach, estava procurando uma peça que não comentasse o final do filme. Queria contrariar isso com alguma coisa, pois o espectador pode tirar suas próprias conclusões.
Você já fez muitos filmes como atriz. Quando começou a sentir o desejo de ser diretora?
Na verdade, foi muito cedo. Nas minhas férias em família, sempre tínhamos uma câmera Super 8 conosco, uma Bolex. Cada um de nós atuava, dirigia ou segurava a câmera. Mais tarde, quando terminei a escola de teatro, na verdade queria ir direto para a academia de cinema para estudar direção. Mas gostava de estar no teatro, gostava de atuar, então só fui para Hamburgo para estudar direção alguns anos depois.
Muitas mulheres se destacaram como cineastas na Alemanha e inspiraram novas gerações. Quais cineastas, do seu país ou de qualquer país, são suas inspirações?
Margarethe von Trotta, com o seu filme Os Anos de Chumbo (1981) sobre a RAF (Fração do Exército Vermelho, também conhecida como Grupo Baader-Meinhof) na Alemanha. Também Os Renegados (1985), de Agnès Varda, e, claro, Lina Wertmüller.
Que conselho você daria às mulheres que querem trabalhar no cinema?
Mesmo que seja difícil e você esteja se sentindo desesperada – não desista.
Letícia Mendes é jornalista e mestranda em estudos sobre as mulheres.
Foto do topo: Juan Naharro G./Contour by Getty Images