Crítica: “Autorretrato de uma Filha Obediente”, de Ana Lungu

Exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, Autorretrato de uma Filha Obediente chega ao circuito comercial brasileiro como mais um exemplar da chamada “nova onda romena”. A diretora, Ana Lungu, foi supervisora de roteiro em A Morte do Sr. Lazarescu, de Cristi Puiu, um dos principais nomes do movimento que é marcado por estilo austero, realista e minimalista.

Seguindo essa linha, os cortes são poucos e a câmera não se move em Autorretrato de uma Filha Obediente: são os atores que entram e saem do quadro e por vezes nos dão as costas, como se não estivéssemos ali – ou melhor, como se assistíssemos a uma cena real.

A história é centrada em Cristiana (Elena Popa, uma das poucas atrizes profissionais do elenco), mulher de 30 anos criada em uma família burguesa da Romênia. Os pais acabam de se mudar para uma casa, deixando Cristiana sozinha em seu próprio apartamento e pronta para aproveitar a tão desejada independência.

Mas a solidão deixa evidente que Cristiana não está muito certa do que quer, ou mesmo de quem é. Com desânimo, passa das conversas com os amigos aos encontros com um homem casado, das reuniões com o orientador do doutorado aos jantares com os pais. Em determinado momento, pergunta para o amigo gay se ele quer ter um filho. Depois, decide ter um cachorro, desejo de infância vetado pela família. Cristiana agora pode escolher. Mas ainda não consegue bancar o animal sozinha.

A dualidade entre querer estar livre dos pais mas não agir para de fato deixar de depender deles está no cerne de Autorretrato de uma Filha Obediente. Está, também, no cerne do processo de amadurecimento de Cristiana, sempre dividida entre quem diz ter vontade de ser e quem de fato é.

Em entrevistas, Lungu afirmou que o filme retrata uma situação típica da Romênia, onde os filhos demoram a deixar a casa dos pais. Mas esta separação tardia tem se tornado mais comum em diferentes partes do mundo, inclusive no Brasil, e tende a crescer em épocas de crise econômica. Por mais absolutamente romeno que o filme seja, e é, também toca em uma ferida universal.

Por seguir tão à risca a cartilha de outros cineasta de seu país, Lungu perde a chance de deixar mais claro seu estilo pessoal. De qualquer forma, é um bom filme de estreia – e uma rara chance de assistir, no Brasil, um filme romeno dirigido por mulher.

“Autorretrato de uma Filha Obediente”
[Autoportretul unei fete cuminti, Romênia, 2015]
Direção: Ana Lungu
Elenco: Elena Popa, Emilian Oprea, Andrei Enache
Duração: 81 minutos

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