“The Post” vai aos anos 70 para defender imprensa na era Trump

Há duas histórias no centro de The Post: A Guerra Secreta, longa-metragem dirigido por Steven Spielberg que chegou aos cinemas brasileiros na mesma semana em que recebeu duas indicações ao Oscar.

A primeira é sobre os chamados Papéis do Pentágono, estudo secreto do governo americano sobre a Guerra do Vietnã (1955-1975) revelado pelo The New York Times em 1971. Vazado por um dos autores, o documento relatou operações militares não divulgadas e escancarou mentiras dos presidentes John Kennedy (1961-1963) e Lyndon Johnson (1963-1969).

O furo foi do Times, mas o roteiro de Liz Hannah e Josh Singer retrata a atuação de um concorrente de menor importância na época, o The Washington Post. Isto porque a segunda história do filme é a de Katharine Graham (1971-2001), publisher do Post na época em que os Papéis do Pentágono foram descobertos – e também mais tarde, durante o escândalo de Watergate, este sim revelado pelo diário com sede na capital americana.

Oscar 2018: Meryl Streep bate o próprio recorde e concorre ao prêmio pela 21ª vez
Leia também: Seis dos nove indicados ao Oscar de melhor filme têm mulheres na produção

As tramas se unem quando o governo de Richard Nixon (1969-1974) proíbe judicialmente o Times de reportar sobre os Papéis do Pentágono, mas o dossiê chega às mãos da equipe do Post. Coube a Graham decidir ir ou não em frente com a publicação dos documentos, a despeito da ação judicial e sob o risco de ameaçar o já incerto futuro financeiro da empresa.

Meryl Streep, Steven Spielberg e Tom Hanks no set do filme “The Post”

The Post ganha força quando o foco está em Graham e na ótima atuação de Meryl Streep, que recebeu sua 21ª indicação ao Oscar pelo papel. A primeira mulher a ocupar o cargo de publisher em uma grande publicação americana enfrentou não apenas a desconfiança dos homens que dominavam os negócios e o jornalismo, mas também sua própria insegurança. Graham assumiu a empresa de seu pai após a morte do marido, ele sim apontado como herdeiro, e The Post acompanha seu difícil processo de adaptação a uma posição de liderança pela qual nunca esperou.

O filme mostra, também, como a decisão sobre os Papéis do Pentágono representava mais do que riscos judiciais e financeiros para Graham: um de seus amigos próximos era Robert McNamara (1916-2009), secretário de Defesa dos Estados Unidos entre 1961 e 1968 e justamente o responsável por encomendar o estudo secreto.

Quando troca a narrativa de Graham pelos esforços da equipe liderada pelo editor executivo Ben Bradlee (Tom Hanks), The Post segue a fórmula de outros filmes sobre jornalismo e não esconde a nostalgia pelos tempos em que a imprensa em geral, e os repórteres investigativos em particular, eram mais valorizados.

É evidente que Spielberg usa os Papéis do Pentágono para na verdade falar sobre o atual governo dos Estados Unidos e os contínuos ataques do presidente Donald Trump a jornalistas e à liberdade de imprensa. O timing dá relevância ao filme, mas por vezes o comentário político é excessivamente óbvio: um discurso solene demais, uma jornalista com lágrimas nos olhos ao som da trilha triunfal de John Williams. The Post é um filme correto, mas menos contundente do que poderia ser.

Veja o trailer de The Post – A Guerra Secreta:


“The Post: A Guerra Secreta”
[The Post, EUA, 2017]
Direção: Steven Spielberg
Elenco: Meryl Streep, Tom Hanks, Bob Odenkirk.
Duração: 116 minutos


Luísa Pécora é jornalista, criadora e editora do Mulher no Cinema.

Deixe um comentário

Top