A cena que abre Mercuriales, drama francês em cartaz no Brasil, mostra um jovem vigia conhecendo os dois prédios nos quais vai trabalhar. Ele visita diferentes ambientes, aprende sobre os equipamentos, observa câmeras de segurança e recebe orientações sobre o que fazer em situações hipotéticas.
Dada a duração da cena – e o fato de os prédios em questão serem as torres Mercuriales, que dão título ao filme – a impressão inicial é que o vigia será terá papel central na trama.
Daí o estranhamento quando ele sai de cena e dá lugar às verdadeiras protagonistas: duas garotas que se conhecem nas mesmas torres e tornam-se amigas inseparáveis. Joane (Philippine Stindel) é francesa, trabalha como recepcionista e sonha em ser dançarina. Lisa (Ana Neborac) nasceu na Moldávia e está em Paris há cerca de um mês. De passados diferentes, elas dividem um presente comum: tédio, falta de oportunidades e poucas perspectivas.
A passagem do jovem para as jovens é significativa por revelar a intenção do diretor Virgil Vernier (autor do roteiro ao lado de Mariette Désert). Mais do que desenvolver uma narrativa, ele quer criar uma colagem de situações enigmáticas, que incluam diferentes personagens, um quê de documentário e outro de fantasia. Assim, nem mesmo Joane e Lisa dominam a cena o tempo todo. Por vezes elas dão lugar a outras histórias, imagens reais de conflitos armados e até ao vigia da primeira cena, que volta a aparecer.
Unindo os diferentes elementos está a região de Bagnolet, onde estão localizadas as torres, um subúrbio de Paris que nada lembra o cartão postal tantas vezes mostrado no cinema. O que se vê, aqui, é uma área industrial abandonada, com projetos habitacionais decadentes, prostituição e vandalismo.
O cenário desolador e a combinação de tantos elementos deixam o espectador intrigado, mas não necessariamente satisfeito. Ao final, a sensação é a de que Vernier, estreante no longa-metragem, poderia ter amarrado algumas pontas sem perder em originalidade.
https://www.youtube.com/watch?v=wZABVRdGnN4
“Mercuriales”
[França, 2014]
Direção: Virgil Vernier
Elenco: Ana Neborac, Philippine Stindel, Jad Solesme
Duração: 108 minutos