Os 10 melhores filmes dirigidos ou estrelados por mulheres em 2019

Chegou a hora de relembrar os filmes que marcaram o ano que está chegando ao fim. Esta lista aponta dez títulos dirigidos ou estrelados por mulheres que ficaram na minha memória em 2019. Foram considerados principalmente os longas que estrearam comercialmente nas salas de cinema do Brasil entre janeiro e dezembro, mas dois títulos lançados direto no streaming também entraram.

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Não deixe de conferir, também, a tradicional reportagem de fim de ano do Mulher no Cinema na qual as diretoras brasileiras escolhem os melhores filmes dirigidos por mulheres. Abaixo, as minhas escolhas:


“Atlantique” – [França/Senegal/Bélgica, 2019]
A franco-senegalesa Mati Diop fez uma bela estreia na direção de longa-metragem com Atlantique, um filme sobre o amadurecimento de Ada, jovem senegalesa que ama o pedreiro Souleiman, mas foi prometida a um homem rico. O que parece ser uma simples história de amor proibido torna-se um comentário social intrigante, marcado por elementos sobrenaturais, pela fotografia impecável de Claire Mathon e pela trilha sonora precisa de Fatima Al Qadiri. Atlantique ganhou o Grand Prix no Festival de Cannes, e é um dos dois filmes dirigidos por mulheres que seguem na disputa pelo Oscar de melhor filme internacional. Disponível na Netflix.


“A Camareira” – [La Camarista, México, 2018]
Outra estreia que aponta para uma carreira promissora é a da diretora mexicana Lila Avilés, que adaptou uma peça de sua autoria para o cinema. Ela conta a história de Eve (Gabriela Cartol, ótima), a reservada funcionária de um hotel mexicano de luxo. Mãe de uma criança pequena, Eve trabalha duro e acumula horas extras em busca de uma prometida promoção, procurando um pouco de poesia nos pertences e no lixo dos hóspedes, que em geral não notam sua presença ou a tratam com desdém. Com poucos diálogos, nenhuma trilha sonora e enquadramentos que nem sempre revelam o cenário ou as personagens por inteiro,  A Camareira diz muito sobre a desigualdade social no México e na América Latina. Leia a entrevista com a diretora 


“Eleições” – [Brasil, 2019]
Durante três meses a diretora paulista Alice Riff e sua equipe visitaram diariamente a Escola Estadual Doutor Alarico Silveira, no bairro da Barra Funda em São Paulo, para acompanhar a movimentação de quatro grupos de estudantes nas eleições do grêmio estudantil. Observando muito e interferindo pouco, o documentário revela um colégio que é microcosmo do Brasil: na eleição do grêmio estão em jogo muitas das questões que estavam em jogo, também, nas eleições presidenciais que elegeram Jair Bolsonaro. Enquanto reflete sobre desigualdade social, intolerância, religião, racismo, homofobia, feminismo e outros temas urgentes, o filme também reforça a importância da escola pública na formação dos jovens e na construção da cidadania. 


“A Favorita” – [The Favourite, Irlanda/Reino Unido/EUA, 2018]
Três mulheres estão no centro do filme do diretor grego Yorgos Lanthimos. O roteiro é inspirado em uma história real: a disputa entre a Duquesa de Marlborough, Sarah Churchill (1660-1774), e sua prima, Abigail Masham (1670-1734), pelas atenções da rainha Anne (1665-1714), que governou a Inglaterra entre 1702 e 1714. Mas a graça de A Favorita está em brincar com as convenções dos filmes de época e deixar de lado a pretensão de mostrar o que de fato aconteceu. Nesta variação da slapstick comedy, cheia de diálogos rápidos e mordazes, brilham as atrizes Rachel Weisz, Emma Stone e, sobretudo, Olivia Colman, que como o filme, transita entre o ridículo, o comovente, a alegria e a dor. Leia a crítica 


“As Golpistas” – [Hustlers, EUA, 2019]
A resposta de Hollywood à demanda por mais filmes centrados em mulheres muitas vezes parece preguiçosa, quando não oportunista: por trás do suposto “empoderamento” estão fórmulas recicladas, mudanças superficiais e roteiros fracos. Em As Golpistas, a diretora e roteirista Lorene Scafaria parece preocupada sobretudo em contar uma boa história de forma divertida e inteligente. Partindo de um caso real – o de um grupo de strippers que aplicava golpes em clientes ricos de Wall Street -, ela debate não apenas estereótipos de gênero e objetificação do corpo feminino, mas também questões tão universais quanto amizade, família e desigualdade social. Sem discursos óbvios, Scafaria parece confiar na ideia de que o “empoderamento” será mais verdadeiro se o filme se conectar com o público e não se parecer com dezenas de outros. Destaque também para Jennifer Lopez, no melhor trabalho da carreira. Ouça uma playlist com hits da trilha do filme 


"Los Silencios", de Beatriz Seigner

“Los Silencios” – [Brasil/França/Colômbia, 2019]
A diretora brasileira Beatriz Seigner está no segundo longa, mas já mostrou ser uma cineasta que olha para o mundo. Em Los Silencios, o encontro é com a América Latina, a condição dos imigrantes e o impacto das diferentes formas de violência. O longa conta a história de Amparo (Marleyda Soto, ótima), que chega à Ilha da Fantasia com os filhos, fugindo do conflito armado colombiano que pode ter matado seu marido (Enrique Diaz). Não ter pressa de explicar o que aconteceu é uma das muitas qualidades do filme. Seigner prefere dar pistas aos poucos, contando em grande medida com o excelente trabalho da diretora de fotografia Sofia Oggioni e da diretora de arte Marcela Gómez, que enchem de significado tanto as cenas com pouca iluminação quanto às cheias de cores fluorescentes. Leia a entrevista com Beatriz Seigner 


“One Child Nation” – [EUA, 2019]
Vi bons documentários neste ano, mas nenhum me impressionou mais do que este do Amazon Prime Video, uma investigação sobre as consequências da Política do Filho Único, vigente na China do final dos anos 1970 a 2015. A diretora Nanfu Wang nasceu e cresceu durante a política e se mudou para os Estados Unidos para fazer faculdade. Após ser mãe, uniu-se à codiretora Jialing Zhang para entender como a medida afetou a sociedade chinesa. Além de traçar um retrato da brutal interferência do Estado em gerações de chineses, ela confronta os atos de sua própria familia. Um filme impactante, que é semifinalista ao Oscar de documentário.


“Poderia me Perdoar?” – [Can You Ever Forgive Me?, EUA, 2018]
Melissa McCarthy brilhou no papel de Lee Israel (1929-2014), escritora americana que, decadente e com problemas financeiros, começou a falsificar cartas de artistas e vendê-las a colecionadores. O filme funciona especialmente porque tanto McCarthy quanto a diretora Marielle Heller e os roteiristas Nicole Holofcener e Jeff Whitty encaram a protagonista sem excesso de julgamento ou de reverência, erros igualmente incômodos das cinebiografias. O filme não tenta justificar os erros da personagem nem busca forçar uma simpatia e carisma que ela não tinha, mas o próprio título indica a disposição de olhar para ela com generosidade. Leia a crítica 


“Temporada” – [Brasil, 2019]
Dirigido por André Novais Oliveira, Temporada tem Grace Passô no papel de Juliana, uma mulher recém-chegada à cidade mineira de Contagem que trabalha no controle de endemias, verificando se há focos de proliferação de mosquitos em casas da periferia. Longe do marido, que ainda não se transferiu, ela passa os dias visitando desconhecidos, fazendo amigos e arrumando a casa. Alguns dirão se tratar de um típico filme em que nada “acontece”. E nada de fato acontece, além da própria vida e das transformações internas. A força que Temporada extrai de situações e paisagens banais (o entulho no quintal, a vista para o aterro sanitário), me lembrou uma frase de Agnès Varda: “nada é banal se olhado com empatia.” Leia entrevista com Grace Passô


“Varda por Agnès” – [Varda par Agnès, França, 2019]
Falando em Varda, no ano de sua morte ela deixou um último belo filme: Varda por Agnès, misto de documentário autobiográfico com aula de cinema que funciona como versão estendida de As Praias de Agnès (2008). Em palestras pelo mundo ela faz reflexões diretas sobre questões que já estão presentes sua obra: a vontade de filmar o que está próximo, a investigação sobre o envelhecimento e a passagem do tempo, a paixão pela criação artística e o ato de compartilhar imagens, o olhar interessado pelas pessoas comuns e os ouvidos atentos às suas histórias, além da notável capacidade de enxergar arte e beleza em praticamente todas as coisas – um caminhão na estrada, um catador de lixo, uma batata descartada por fugir ao padrão do supermercado. Ela fará falta, mas o legado é imenso. Leia a crítica


Luísa Pécora é jornalista e criadora do Mulher no Cinema

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