O ano em que descobrimos Margaret Atwood

Eis um item para a lista de coisas boas que aconteceram em 2017: foi o ano em que descobrimos Margaret Atwood.

É verdade que a escritora canadense de 78 anos e mais de 40 obras publicadas já era um nome importante da literatura, vencedora do Booker Prize e dos prêmios Príncipe das Astúrias e Arthur C. Clarke, entre outros. No entanto, 2017 foi o ano em que Atwood chegou à cultura pop: seu nome apareceu nas listas de mais vendidos, os livros entraram nos cronogramas dos grupos de leitura e fantasias de aias tomaram às ruas, seja em protestos ou festas de Halloween.

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Por trás desta (re)descoberta estão duas séries inspiradas na obra da autora que chegaram à televisão (mais precisamente ao streaming) em 2017. Em abril, The Handmaid’s Tale fez tanto sucesso que o Hulu optou pela renovação para a segunda temporada logo após a exibição do primeiro episódio. Em setembro, foi a vez de Alias Grace, produção da Netflix em parceria com a rede canadense CBC, estrear em um dos principais festivais de cinema do mundo, o de Toronto.

Para além da qualidade das duas obras e das adaptações, não há dúvida de que o timing ajudou. Da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos à recente iniciativa de parlamentares brasileiros de proibir qualquer tipo de aborto, mesmo em caso de estupro, o noticiário da vida real tem dado nova relevância à ficção de Margaret Atwood. De repente, já não parecemos tão longe da sociedade distópica que trata as mulheres como propriedade do Estado, descrita em O Conto de Aia, livro que inspirou The Handmaid’s Tale e foi publicado em 1985. Da mesma forma, a sociedade canadense de 1800 retratada em Vulgo Grace, obra de 1996 que inspirou Alias Grace, está longe de ser datada, e toca fundo em temas como aborto e estupro.

Olhando para o futuro ou para o passado, Atwood tornou-se uma artista-chave para os dias atuais ao provocar um questionamento urgente: o quanto avançamos, ou não avançamos, nos direitos das mulheres?

A expectativa é que esse questionamento continue ecoando nas telas: a estreia da segunda temporada de Handmaid’s Tale está marcada para abril, e a própria Atwood afirmou que há negociações para adaptações de outros livros seus. O interesse não surpreende, já que a obra da canadense pode oferecer algo que continua em falta no cinema e na televisão: personagens femininas complexas e bem desenvolvidas.

Como ela mesma definiu, em um artigo publicado pelo jornal americano The New York Times:

O Conto da Aia é um livro feminista? Se você se refere a um folheto ideológico no qual todas as mulheres são anjos e/ou tão vitimizadas que tornam-se incapazes de fazer escolhas morais, não. Se você se refere a um romance em que as mulheres são seres humanos – com toda a variedade de caráter e comportamento que isso implica – e também são interessantes e importantes, e o que acontece com elas é crucial para o tema, a estrutura e a trama do livro, então sim.”

Celebre o ano em que descobrimos Margaret Atwood com essa playlist inspirada na obra da autora preparada pela Fuzz Soluções Musicais. Há canções das trilhas de Handmaid’s Tale e Alias Grace, além de outras coisinhas mais. Praised be!


Luísa Pécora é jornalista, criadora e editora do Mulher no Cinema.

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