8 protagonistas do cinema que você precisa conhecer, segundo artistas brasileiras

Colocar mulheres no centro das narrativas, contar histórias diversas, criar protagonistas cheias de nuance e que fujam aos estereótipos. Nos últimos anos, tanto as profissionais do audiovisual quanto o público que adora cinema têm exigido mudanças no modo como as mulheres são representadas na tela. E ao que tudo indica, a pressão tem começado a dar sinais positivos.

Leia também: Como a comédia De Perto Ela Não É Normal usou o inclusion rider no Brasil
Leia também: 10 filmes com mulheres na direção de fotografia para ver online
Saiba mais: Veja sugestões de filmes para assistir no streaming do Telecine

De acordo com estudo da San Diego State University, coordenado por Martha P. Lauzen, mulheres protagonizaram 40% dos 100 filmes de maior bilheteria nos Estados Unidos no ano passado – um índice que nunca tinha sido alcançado desde que a pesquisa começou a ser feita. Para se ter uma ideia, em 2018 a porcentagem ficara em 31%; em 2015, em 22%; e em 2002, era de apenas 16%.

É claro que ainda há muito espaço para melhora, já que mais protagonismo nem sempre significa protagonismo de qualidade. Quando se analisam todas as personagens com fala dos 100 filmes, percebe-se que muitos estereótipos resistem: as mulheres têm mais chances de terem seu estado civil definido na trama, e menos chances de terem uma profissão ou serem vistas trabalhando. Questões de raça também seguem profundamente desiguais: de todas as mulheres com fala nos filmes de maior sucesso do ano passado, 69% eram brancas.

No Brasil, o debate sobre as mulheres nas telas também tem se fortalecido. Um exemplo é o prêmio Cabíria, idealizado pela roteirista Marília Nogueira para estimular a criação de protagonistas mulheres que sejam complexas e bem desenvolvidas. Realizado anualmente desde 2015, o prêmio se desdobrou no Cabíria Festival, que neste ano exibe filmes online até 29 de novembro. O Telecine apoiou o evento com uma uma sessão gratuita de Papicha, uma masterclass da diretora Mounia Meddour e uma cinelist que reúne filmes dirigidos e protagonizados por mulheres disponíveis na plataforma de streaming e selecionados pela equipe do Cabíria.

Como dica boa nunca é demais, o Mulher no Cinema convidou cinco atrizes, diretoras e roteiristas brasileiras que apoiam o Cabíria a responder: qual protagonista você considera bem desenvolvida? Confira os depoimentos abaixo e assista a todos os filmes recomendados no streaming do Telecine:

*

Amélie Poulain em O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001)

escolhida pela diretora e roteirista Sabrina Fidalgo

“Escolhi Amélie porque amo este filme! Ele me acompanhou durante anos, assisti muitas vezes, e para mim, é uma aula de cinema. Está nesse lugar de construção de personagem e de narrativa. É uma protagonista única, que conduz o filme inteiro, do início ao fim – é ela, ela, ela. E você não se cansa, porque além de a personagem ser carismática e de a atriz Audrey Tautou ser maravilhosa, a construção de roteiro a partir da sucessão de acontecimentos na vida dela funciona perfeitamente. Tudo dá certo nesse filme. Diria que é o filme perfeito no sentido técnico e nas sensações que causa nos espectadores. Também acho que a personagem cria identificação com mulheres que não se enquadram nos padrões estabelecidos pela sociedade, seja pela atitude ou por questões físicas ou psíquicas. É uma personagem que está totalmente fora da caixinha. E é um filme poético, uma poesia filmada. Amélie é pura poesia. Sinto falta de personagens assim. O cinema atual, principalmente autoral e aqui do Brasil, está um pouco viciado em uma linguagem hiperrealista na qual não cabe sonho e fantasia. Acho que Amélie está nesse lugar: é um filme fantasioso, poético, que brinca com a quimera, o sonho. É um filme lindo, que me emociona sempre, e que na minha opinião tem uma das melhores personagens femininas. Já vi críticas sobre ela, mas eu, pessoalmente, amo. Ela me contempla.” Sabrina Fidalgo


Glória e Camila em Praça Paris (2017)

escolhidas pela atriz Cristina Lago

“Recomendo o longa-metragem Praça Paris, da diretora Lucia Murat, que nos apresenta duas personagens complexas e super bem construídas. O filme é um thriller que mostra o conflito entre uma psicanalista portuguesa, Camila (Joana de Verona), e sua paciente, Glória (Grace Passô), num Centro de Terapia de uma universidade brasileira (UERJ). A personagem de Grace tem uma história de violência muito dura, foi estuprada pelo pai e tem um único irmão que era chefe do tráfico do morro. Mas ela não se limita a ser apenas uma vítima da violência ou uma moradora do moro. Glória é dona da sua própria verdade. Preciso destacar também a atuação de Grace Passô, que imprime toda a intensidade da personagem no ponto certo, seu olhar magnetizante impressiona e tenciona o expectador na frente da tela.” – Cristina Lago


Harriet Tubman em Harriet (2019)

escolhida pela diretora e roteirista Graciela Guarani

“As pluridiversidades femininas no cinema vêm traçando um caminho muito lindo, potente! Atualmente vemos como é necessário estas identidades femininas emergirem cada vez mais. E é neste sentido que destaco a personagem Harriet Tubman, interpretada por Cynthia Erivo no filme Harriet, presente na cinelist do Cabíria no streaming do Telecine. Harriet representa toda a potência de uma personagem necessária. Ao mesmo tempo em que aborda temáticas inflamatórias no sentido histórico, traz um empoderamento e heroísmo em suas ações no filme. Falar de papéis de personagens mulheres no cinema também é falar de histórias que nos inspiram, personagens que nos empoderem como a saga de Harriet – sejam mulheres negras, indígenas, brancas…mas que nos contemplem na leveza e na potência que carregamos.” – Graciela Guarani


Irene, de Benzinho (2018)

escolhida pela atriz e diretora Marina Person

“Gostaria de destacar a Irene de Benzinho, filme escrito e protagonizado pela Karine Teles. Já admirava muito o trabalho da Karine, mas quando assisti a Benzinho fiquei super impressionada com a profundidade da sua personagem. Irene é mãe de três filhos: um já está em idade de sair de casa, se preparando para seguir sua vida longe da família, e os outros dois são gêmeos e bem mais novos. É uma mãe que precisa lidar com filhos em épocas bem diferentes da vida, e ao mesmo tempo a família é muito sem grana e mora em uma Petrópolis que a gente não costuma ver no cinema. Não é a cidade turística dos casarios das famílias imperiais, é a Petrópolis do dia a dia, das pessoas que moram lá de fato e para quem aquilo é tudo menos férias. Petrópolis é a cidade da própria Karine e do Gustavo Pizzi, que é diretor do filme e também roteirista e ex-marido da Karine. Eles escreveram o roteiro a quatro mãos e acho que há uma verdade que transparece demais no resultado final do filme. Os gêmeos são filhos deles na vida real e isso também faz diferença na hora de a gente assistir, porque a interpretação fica totalmente verdadeira. Não sabia disso quando assisti, mas fiquei muito impressionada com a interação que eles tinham e a intimidade que conseguiram passar. É tudo muito bonito: a força dessa personagem, dessa intimidade, desse carinho com as crianças. É uma grande interpretação da Karine, e acho que faz muita diferença o fato de ela também ter sido a roteirista. O talento para o roteiro me faz admirar ainda mais o trabalho dessa grande atriz.” – Marina Person


Marianne e Héloïse em Retrato de uma Jovem em Chamas (2019)
e Joan Castleman em A Esposa (2017)

escolhidas pela atriz Maeve Jinkings

“Gosto muito das personagens femininas de Retrato de uma Jovem em Chamas. Todas as personagens ali são multidimensionais e noto um interesse genuíno do roteiro em compreendê-las. Também gosto especialmente de como a câmera se aproxima de seus corpos, de como revela seu erotismo sem objetificá-las e sem apelar a excessos tão comuns na indústria. Gostaria de citar outro filme que não está na cinelist do Cabíria, mas pode ser visto no streaming do Telecine: A Esposa. Glen Close interpreta brilhantemente um papel que dezenas de milhares de mulheres viveram (e ainda vivem) – o apagamento profissional em nome do papel social que lhe foi relegado: o de esposa. Considero esse tema um dos mais relevantes ainda hoje. Quem está deixando de produzir durante a pandemia? Mulheres, majoritariamente. Gosto da maneira como o filme retrata esse sacrifício humano normalizado pelo patriarcado a fim de sustentar as bases do capital.” – Maeve Jinkings


* Este texto foi produzido pelo Mulher no Cinema e é patrocinado pelo Telecine

Top